Dilema entre situação de carroceiros e bem-estar animal é debatido na CMJP

por Secom CMJP — publicado 15/10/2021 15h40, última modificação 15/10/2021 15h42
Colaboradores: Foto: Juliana Santos
Uma das reivindicações apresentadas durante a Sessão Especial é que os carroceiros não percam sua renda

A Câmara Municipal de João Pessoa (CMJP) debateu, na manhã desta sexta-feira, 15, a causa animal e a situação das pessoas que trabalham com veículos de tração animal na Capital. A sessão especial foi proposta pelo vereador Guga (Pros) e contou com a participação de ativistas dos direitos dos animais, carroceiros e demais envolvidos com o tema.

O vereador Guga (Pros) destacou que a causa animal é a principal bandeira do seu mandato. Ele informou que esteve em Brasília e conseguiu quase R$ 1,5 milhão em emendas para construção do Hospital Veterinário de João Pessoa e cerca de R$ 1,2 milhão de emendas junto à senadora Nilda Gondim (MDB) para área de zoonoses. O vereador também informou que visitou Recife e constatou que a capital pernambucana avançou em relação a João Pessoa, pois já foi construído o Hospital Universitário de Recife e existe na estrutura da gestão municipal a Secretaria de Bem-Estar Animal.

“Diariamente, venho lutando em favor dos protetores independentes e das ongs. As autoridades e o Poder Pùblico precisam se juntar nessa luta. Também precisamos saber como vão ficar os 260 pais de família carroceiros e os animais quando essa atividade for definitivamente proibida na nossa cidade”, ressaltou o vereador. Ele demonstrou preocupação com a efetivação e as consequências da Lei 13170/2016, proposta pelo vereador Bruno Farias (Cidadania), que proíbe o trânsito de veículos de tração animal e a condução de animais com carga. 

O professor e coordenador do Núcleo de Justiça Animal da UFPB, Francisco Garcia, destacou que a lei que proíbe a circulação de carroças na capital é completa. “Ela estabelece que o poder público municipal é obrigado a inserir esse pessoal [os carroceiros] no mercado de trabalho. A lei não só ampara os animais, mas também aqueles que dependem dos animais”, destacou, salientando que a legislação abrange as necessidades humanas e animais.

O presidente Associação Beneficente de Carroceiros da Capital (ABCJP), Paulo César, afirmou que a categoria não tem apoio do poder público para que a lei seja cumprida. “Em 2016 nos mobilizamos e pedimos a fiscalização da prefeitura, que ela viesse a cadastrar os carroceiros para fazer o acompanhamento e a realização de ações para ajudar a categoria, mas não tivemos esse apoio”, afirmou, ressaltando que a prefeitura deve, aos poucos, substituir as carroças de tração animal por bicicletas ou motocicletas para que venha um dia a zerar o uso das carroças. “A gente não quer continuar, mas somos pais e mães de famílias que não podem abrir mão de seus veículos”, salientou.

“Vamos conseguir essas bicicletas e ferramentas de tração. O tempo evoluiu, temos como substituir os animais e a lei já existe para isso, então vamos cobrar. Temos que nos preocupar com a causa animal, sim, e com os carroceiros também, pois temos que ajudar esses homens a sustentar a família e proteger os animais”, afirmou o vereador Carlão (Patriota).

A chefe da Divisão de Controle de Zoonoses da prefeitura de João Pessoa, Pollyana Dantas, enfatizou que todos, sejam humanos ou animais, merecem respeito e informou que existem alternativas para a substituição dos animais por veículos motorizados de baixo custo, que vão aumentar a possibilidade de carga transportada e evitar danos à natureza.

“Vivemos o melhor momento da proteção animal em nossa cidade. Estamos elaborando projetos e processos para dirimir essas demandas. Poderão ser realizadas parcerias através de isenção fiscal para substituir os veículos e para capacitação das famílias, para que possam migrar para outras atividades, se assim quiserem”, afirmou.

A protetora independente Sandra enfatizou que existem denúncias diárias sobre os maus tratos animais na cidade e que a burocracia para efetivá-las pode levar a crer que elas não existam. “A situação de maus tratos só aumenta e nós protetores independentes estamos lotados. Os animais transformam a vida dos humanos, muitas vezes mais que os próprios humanos”, declarou. A ativista animal independente Rosângela solicitou à prefeitura da Capital que além do hospital veterinário haja também a criação do cemitério animal.

O dono da empresa Transnobre, que administra o Centro de Manejo de Animais Apreendidos de João Pessoa, Reginaldo Nobre, explicou que a empresa tem duas equipes de apreensão e que os animais têm toda atenção ao entrarem no Centro. “No ano passado recolhemos 1.622 animais de grande porte e este ano já foram 486 apreendidos. João Pessoa é uma das capitais do país que não registrou qualquer acidente com animal”, revelou.

O Major Fabiano, do Batalhão Ambiental, explicou que o trabalho desempenhado pela Polícia Militar abrange, no caso de maus-tratos, animais silvestres e, também, domésticos. Estes, ao contrário dos silvestres, não têm para onde serem conduzidos e isso dificulta o trabalho. Ele falou sobre outros fatores que também têm interferido: “Com relação aos maus-tratos, a gente praticamente não pode nem agir porque não tem mais para onde levar esses animais. Nestes casos, conduzimos o acusado à delegacia para ser autuado em flagrante e os procedimentos legais que devem seguir”.

Fabiano informou que o Batalhão Ambiental age a partir das denúncias realizadas e que chegou a ser denunciado por negligência por não conseguir apreender animais usados na tração de carroças. Segundo ele, esse tipo de registro não acontece porque a maior parte das pessoas entende como uma prática normal: “A sociedade não denuncia. A polícia militar não pode ser responsabilizada por não agir quando a sociedade entende um fato como normal”.

Welison Silveira, secretário de Meio Ambiente de João Pessoa, comentou que o momento é de diálogo para conhecer as necessidades dos carroceiros e a realidade dos animais. Dentre as reivindicações apresentadas, ele falou sobre a importância de haver um censo para saber quem são os carroceiros e, assim, adotar medidas eficazes. Enquanto Secretaria do Meio Ambiente, ele afirma o compromisso de preservação, sabendo que o homem também é integrante do meio ambiente, e lembrou que existe o pedido de atenção social a esses profissionais que têm uma importância econômica para a sociedade.

Silveira contou que algumas providências já começaram a ser tomadas, mas há, também, reivindicações relativas à readequação de ecopontos e substituição dos animais por veículos de motor, por exemplo, que estão sendo estudadas para que a transição seja feita da melhor forma possível. Por isso, pediu o empenho de todos e salientou que: “O ponto central é que a gestão está aberta ao diálogo, tomando as providências propostas na ACP. Vamos cuidar do bem-estar animal e da vida desses profissionais que têm sua importância”.

Charles, representante dos carroceiros, enfatizou que a categoria não é a favor dos maus-tratos aos animais: “Não é porque queremos, mas porque as autoridades competentes não nos dão a oportunidade de trabalhar, porque o que queremos, de fato, é trabalhar honestamente. Meus três filhos precisam do meu trabalho”. Ele ainda relatou que a associação faz o possível para que os animais sejam bem tratados e que se algum carroceiro maltrata o seu cavalo, é excluído do grupo.

“O carroceiro não é vilão. É um trabalhador que depende daquilo para ter o seu ganha-pão. Tem muitas pessoas defensoras dos animais e, pelo que estou vendo, pouquíssimas são dos seres humanos, dos pais de família. Não estamos aqui lutando pela continuidade das carroças nas ruas. Estamos buscando os nossos direitos. Tirem as carroças de nós, mas nos deem algo que faça com que meus filhos se alimentem todo dia. E, aqueles que maltratam animais, somos a favor que sejam punidos. É por causa deles (os animais) que adquirimos nossa alimentação e não somos capazes de maltratar quem nos alimenta”, reforçou.

Em resposta a Charles, o vereador Guga disse que não será admitido que as carroças sejam tiradas de circulação sem que antes haja um projeto de proteção à categoria. “Em nenhum momento a gente defendeu aqui que vocês ficassem desempregados, porque não estou de acordo e nem aceitaria isso. Vocês são cidadãos de bem, trabalham dignamente e precisam do pão de cada dia, mas, também não aceitamos que os cavalos, os animais, sejam maltratados”, ponderou.