Documentos históricos com mais de 200 anos são achados na CMJP

por Haryson Alves — publicado 03/08/2019 03h00, última modificação 02/08/2019 13h24
Colaboradores: Fotos:Juliana Santos
Acervo de 700 páginas do século XIX relata curiosidades sobre João Pessoa e seu cotidiano

Uma organização no arquivo da Câmara Municipal de João Pessoa (CMJP), no final de 2017, resultou no achado inesperado de aproximadamente 700 páginas de documentos históricos do século XIX, contendo relatos da História da Capital paraibana. Os manuscritos compõem 250 documentos do final do Período Colonial, início do Império e começo da República brasileira, revelando detalhes do cotidiano dos cidadãos de João Pessoa, numa época em que as atividades da Câmara se confundiam com o trabalho de uma prefeitura e um juizado no âmbito municipal.

“Foi engrandecedor e empolgante quando folheei aquela papelada e percebi do que se tratavam aqueles relatos. Era a História de João Pessoa. A primeira coisa que pensei ao me dar conta disso foi achar meios de conservar aquele material, para que outros pudessem ter acesso”, relembrou Eron Mendes, então servidor da CMJP, de quando se deparou com a papelada histórica, ao organizar documentos no Setor de Arquivo da Casa, no final de 2017.

Este foi o pontapé inicial para que os registros unissem uma equipe com mais de 20 pesquisadores da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) em prol do levantamento historiográfico, restauração e digitalização do material. “A princípio, a CMJP só teria documentação de 1947, devido às câmaras terem sido fechadas no Estado Novo, em 1937. A hipótese é de que a caixa contendo arquivos históricos encontrada na Câmara seja uma parte pequena, talvez 1%, de um acervo que era bem maior e se perdeu devido à ação do tempo, chuva, mofo e mal estado de conservação”, estimou o historiador e professor do Departamento de História da UFPB, Ângelo Emílio Pessoa.

Acréscimo aos arquivos históricos: JP tinha teares manuais em 1828

Variando em documentos de uma a três páginas, 20% dos registros históricos encontrados datam de 1814 a 1816. A maior parte corresponde a manuscritos de 1824 a 1828, e há um livro de atas correspondente ao período de 1910 a 1912. Em um dos títulos, de 1º de agosto de 1828, consta que havia 2.260 domicílios na Cidade de Nossa Senhora das Neves. Entre outros assuntos, as escrituras relatam escolas de primeiras letras, o descarte de lastros de navios dificultando a navegação, a pesca no Rio Sanhauá, e o conserto de estradas e pontes como algo que afetava diretamente o fornecimento ao mercado da cidade.

Na papelada, também constam particularidades sobre o transporte de carros por tração animal, o abastecimento urbano, como bicas e chafarizes entupidos, ou conflitos pelo acesso à água em cacimbas. Também há registros de pagamento dos funcionários públicos, além da constatação de que, em frente à Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), no Centro, onde há um posto de gasolina, havia plantio de capim e olarias, locais onde eram produzidos objetos de cerâmica.

“Teremos dados sobre a História da cidade que não são grandiosos, no sentido de serem uma revolução ou uma luta por independência, mas que mostram assuntos minuciosos a respeito do dia a dia da cidade. São temas sobre os quais, apesar de já termos acesso em outros arquivos, a partir dos documentos encontrados na CMJP, obtivemos acréscimos ao que já existia registrado sobre a cidade de João Pessoa”, confirmou o professor Ângelo Emílio Pessoa.

Um exemplo disso está no registro que narra uma solicitação à Câmara para que verificasse o funcionamento de teares manuais na cidade, em 1828. O intuito era diagnosticar quem tinha autorização para exercer a atividade, de forma a manter o recolhimento de imposto sobre o ofício. “Essa informação é surpreendente. Não tínhamos conhecimento de que já havia esse tipo de atividade manufatureira na cidade nessa época”, atestou o historiador.

Em 1825, chegou à Câmara uma correspondência de Londres, na Inglaterra, informando sobre um aparato capaz de ressuscitar pessoas afogadas. Um ano depois, o vereador Manoel Gameiro comprou a ideia e sugeriu à casa legislativa que adquirisse o aparelho, indicando que a ‘máquina ressuscitadora’ fosse instalada na praia.

Também em 1825, a Câmara foi informada a respeito do nascimento de Dom Pedro II, na cidade do Rio de Janeiro. O documento citava o festejo dedicado ao filho do imperador Dom Pedro I na igreja matriz, sugerindo iluminação especial na cidade e repiques de trombeta.